O novo edifício “poloTErRA”,
do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), localizado na Área-2 do Campus
USP de São Carlos, nasceu de um projeto lançado pelo Governo do Estado de São
Paulo entre os anos de 2008 e 2009, com o objetivo de se desenvolver a área de
biotecnologia e bioenergia no Estado e com isso poder abranger o território
nacional.
A partir desse projeto e
através de uma sólida parceria entre o Governo do Estado, a FAPESP e a USP, foi
criada a Rede Paulista de Bioenergia, com cada ator a iniciar uma série de
iniciativas específicas para esse fim. A USP encarregou-se de contratar
técnicos e pesquisadores, a FAPESP, por seu lado, financiou projetos de
pesquisa nas áreas de interesse, e o Governo do Estado, por sua vez, não só fez
o investimento na construção das infraestruturas necessárias, como também
transferiu verbas para que cada uma das três universidades estaduais
modernizassem seus laboratórios e centros de pesquisa.
Particularmente, a USP
investiu em três áreas importantes: a construção do edifício “poloTErRA”, em
São Carlos, os laboratórios na Escola Superior
de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), em Piracicaba, e na USP de São
Paulo, para permitir que os pesquisadores interessados no programa e no projeto
pudessem ter possibilidades de trabalhar em condições adequadas.
Como já informamos acima,
implantado na Área-2 do Campus USP de São Carlos, a construção do edifício
“poloTErRA” passou por uma série de desafios ao longo dos últimos onze anos,
com a falência de duas das empresas encarregadas da construção e que
acarretaram inevitáveis atrasos e contratempos, problemas que, contudo, não
retiraram o entusiasmo e a entrega do Prof. Igor Polikarpov, docente e
pesquisador do IFSC/USP responsável pela infraestrutura e que acompanhou todo o
processo. “Apesar desses atrasos, estamos cumprindo a nossa missão fundamental,
trabalhando nesta área de biotecnologia molecular em prol do Estado de São Paulo
e do País”, comemora Igor.
Para o pesquisador, o
“poloTErRA” tem um perfil bem definido, desenvolvendo pesquisas que são a
especialidade de quem trabalha neste novo Polo: caracterização bioquímica,
biofísica estrutural de enzimas ativas em carboidratos complexos, bem como nos
estudos de biomassa de resíduos agrícolas, nos pontos de vista químico e
físico, prevendo-se, para breve, a introdução de outros destaques. “Os resíduos
agrícolas são substratos nos quais as enzimas
atuam e, por isso, existe uma grande interação com outros pesquisadores do
IFSC/USP que trabalham em paralelo com as nossas pesquisas, utilizando as
técnicas físicas disponíveis para entender as estruturas físicas desses
substratos. Como todo o nosso aprendizado e evolução do nosso conhecimento em
cristalógrafos de proteínas, implantamos aqui a infraestrutura que permite a
clonagem, expressão, purificação, cristalização e resolução estrutural de
macromoléculas que se encontram inseridas num gigantesco grupo de proteínas que
atuam em carboidratos complexos. Estes carboidratos complexos encontram-se, por
exemplo, na parede celular de plantas, com milhares de ligações químicas e
milhares de enzimas que criam e degradam essas mesmas ligações”, explica o
pesquisador.
*Etanol celulósico (etanol verde
ou etanol de segunda geração)
A produção do designado etanol
celulósico (etanol verde) começou a ser desenvolvida há já algum tempo,
principalmente através de várias iniciativas nos Estados Unidos e na Europa,
grande maioria dos quais entretanto não deram certo devido às dificuldades de
execução, sendo que no Brasil esse projeto foi um sucesso. “O Brasil é um país
agrícola e por isso tem muito resíduos que, antigamente, eram muito mal
aproveitados e utilizados. Ao finalizar a produção de açúcar e etanol, por exemplo, sobra o bagaço e o que se fazia
antigamente era queimá-lo... Um desperdício! Então, a tecnologia de produção de
etanol celulósico despontou no Brasil, sendo que os Estados Unidos reiniciaram
esse projeto enquanto os países em desenvolvimento, como a Índia e Indonésia
aparecem agora com projetos muito forte nessa área. O melhor exemplo, no
Brasil, foi e está sendo dado pela empresa Raizen que já confirmou a construção
de sete mega-usinas que serão adicionadas à já existente. Dessa forma, a produção
de etanol celulósico por essa empresa - que é de 30 milhões de litros/ano -
passará num futuro próximo para 680 milhões de litros/ano, algo que é
verdadeiramente extraordinário, tendo em consideração que a empresa já tem toda
a sua safra vendida para os próximos cinco anos. Com isso, irão ser criados -
direta e indiretamente -milhares de postos de trabalho para os próximos vinte
anos, além da venda da tecnologia.”, sublinha o Prof. Igor Polikarpov,
acrescentando que o poloTErRA está contribuindo para todo esse processo,
inclusive com a formação de alunos que já hoje desempenham cargos importantes
setores produtivos nacionais e no exterior.
poloTErRA - Ampliando
horizontes científicos
Além da compreensão dos
mecanismos de ação das enzimas em carboidratos complexos, o poloTErRA ainda tem
vários desafios pela frente e que ampliam seus horizontes científicos para
outras áreas, como é o caso da indústria do papel celulose, que é bastante
forte no Brasil. Assim, outra linha de ação é usar as enzimas para facilitar o
processo de uma desfibrilação da celulose para produzir a calulose
nanofibrilada que pode ajudar tornar o papel mais resistente para determinadas
aplicações cotidianas.
Outro exemplo do aumento dos
horizontes do “poloTErRA” - talvez mais ousado - é o estudo das enzimas como
arma de combate à resistência aos antibióticos, conforme explica o Prof. Igor
Polikarpov. “Começamos a prestar atenção na forma como os microrganismos vivem.
O ciclo de vida das designadas bactérias-livres, que se grudam a uma determinada
superfície, é prolongada porque elas criam um biofilme, vivendo dentro dele,
onde se comunicam entre si e se protegem das condições adversas do meio
ambiente. Quando o recurso de sua sobrevivência se esgota, as bactérias-livres
rompem o biofilme e migram para novos locais (novas superfícies),
reproduzindo-se e criando novas colónias e novos biofilmes. Aí, elas têm a
particularidade de escapar à ação dos antibióticos, ficando resistentes devido
ao biofilme. Esse é um problema muito sério em termos de saúde pública, já que
existe a produção de novas cepas resistentes das bactérias. Dessa forma,
começamos a estudar do que é feito esses biofilmes e descobrimos que eles são
feitos de DNA extracelular, proteínas e, principalmente, de exopolissacarídeos (estes
últimos na ordem dos 85%). Observamos, então, que esses exopolissacarídeos
lembram muito os polissacarídeos usados pelas plantas na construção de suas
paredes celulares. Esses biofilmes servem exatamente para proteger as bactérias
da ação dos antibióticos”, explica o pesquisador.
Assim, ao degradar o biofilme,
a equipe de Igor Polikarpov conseguiu expor as bactérias aos antibióticos,
aniquilando-as. “Esta poderá ser uma importante contribuição para o combate à
resistências aos antibióticos, sendo um processo muito mais viável e
economicamente mais barato do que desenvolver novos fármacos que estão sempre
sujeitos a uma eficácia de curta duração devido ao surgimento de novas cepas
bacterianas. Vamos ver se conseguimos desenvolver coquetéis enzimáticos para
essa finalidade, cujo propósito é salvar vidas”, conclui Igor Polikarpov.
A expectativa do responsável
pelo poloTErRA é de poder agregar mais pesquisadores e especialistas nos estudo
que estão sendo elaborados, por forma a aumentar a interdisciplinaridade, com a
introdução de novas tecnologias, começando pela Inteligência Artificial e
Biotecnologia Avançada.
*O Etanol Celulósico (etanol
verde), também chamado etanol de lignocelulose ou de segunda geração, é a
denominação dada ao etanol obtido a partir da quebra das cadeias da celulose,
hemicelulose e pectina, que são polímeros que constituem a estrutura fibrosa
dos vegetais, através de reações químicas ou bioquímicas. Uma das principais
matérias-primas usada para produção do etanol celulósico é a biomassa de
plantas composta pelos resíduos das colheitas e do processamento de vegetais,
que não é utilizada para alimentação humana e animal, ou para outras
finalidades.