Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) veem sua atual postura na eleição municipal de São Paulo como uma estratégia para manter "um pé em cada canoa" na disputa pela cidade que concentra o maior colégio eleitoral do País. Enquanto declara apoio formal à reeleição de Ricardo Nunes (MDB), inclusive com a expectativa de aparecer no horário eleitoral do prefeito, Bolsonaro decidiu levantar a bandeira branca para o ex-coach Pablo Marçal (PRTB), com quem ensaiou uma rivalidade recentemente.

Na semana passada, o ex-presidente distribuiu em seu canal no WhatsApp, onde soma mais de 1,2 milhão de seguidores, um vídeo resgatando falas controversas do empresário na eleição de 2022. No mesmo dia, Bolsonaro respondeu, de forma irônica, a um comentário do ex-coach em sua publicação.

Ontem, no entanto, os sinais foram em direção oposta: Bolsonaro gravou um vídeo abrindo espaço para Marçal participar do ato de 7 de setembro e seu "filho 02", o vereador Carlos Bolsonaro (PL), foi às redes sociais anunciar que resolveu seus problemas com Marçal após uma conversa com o ex-coach por telefone

"Estamos no muro, vendo no que vai dar. Apostamos no cavalo errado e quem está na frente é o azarão", disse, reservadamente, um aliado próximo do ex-presidente.

Na visão desse aliado, o entorno de Bolsonaro percebeu que as chances de Marçal chegar ao segundo turno são reais e concluiu que era melhor evitar um rompimento com o ex-coach, que pode virar o adversário de Guilherme Boulos (PSOL) no segundo turno e a esperança da direita em São Paulo.

O recuo da família Bolsonaro ocorreu no mesmo dia em que a pesquisa Quaest mostrou que a campanha negativa do ex-presidente e seu círculo contra Marçal não teve o impacto esperado. A Quaest foi a campo entre os dias 25 e 27 de agosto, ou seja, depois que o clã Bolsonaro abriu uma guerra contra Marçal nas redes sociais. Aliados do ex-presidente esperavam que a ofensiva resultasse num derretimento do ex-coach nas pesquisas, mas isso não aconteceu.

O resultado da Quaest está alinhado com o último Datafolha, que mostrou Marçal tecnicamente empatado com Nunes e Boulos - embora as duas pesquisas não sejam diretamente comparáveis, pois adotam metodologias diferentes.

Fabio Wajngarten, assessor e advogado de Bolsonaro, declarou logo após a divulgação do Datafolha, no último dia 22, que qualquer pesquisa divulgada nas 72 horas seguintes aos ataques do entorno de Bolsonaro contra Marçal não refletiria a verdadeira situação eleitoral em São Paulo.

"Somente no próximo round de coleta de intenção de voto teremos fidedignidade e segurança nos dados. A intenção de voto é dinâmica e cada máscara que cai influencia e faz diferença", escreveu Wajngarten. Com a divulgação da Quaest, fica evidente que Bolsonaro não conseguiu dissuadir seu eleitorado de apoiar a candidatura do ex-coach.

Também influenciaram a mudança de tom de Bolsonaro a relação desgastada com Nunes - que, na visão de pessoas próximas ao ex-presidente, não tem acenado suficientemente às pautas bolsonaristas - e as duras críticas que a família Bolsonaro recebeu de seus apoiadores nas redes sociais devido à aliança com o prefeito. "Se o nosso eleitor está querendo apoiar o Marçal, quem somos nós para dizer o que o povo deve fazer? Essa é a postura do ex-presidente", avalia um aliado do ex-mandatário.

O entorno de Bolsonaro considera improvável que ele rompa com a campanha de Nunes para apoiar Marçal, especialmente porque o vice na chapa de Nunes, o coronel Ricardo Mello Araújo, foi indicado por Bolsonaro. Além disso, pesa o fato de o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ter se tornado o principal articulador da candidatura do prefeito. A indefinição da corrida eleitoral paulistana também força Bolsonaro a evitar um rompimento tanto com Nunes quanto com Marçal.

Após o vaivém do ex-presidente, o diretório municipal do PL em São Paulo, comandado por Isac Félix, aliado de Nunes, divulgou uma nota reafirmando o apoio à candidatura do prefeito.

"Tendo em vista que somos um partido que honra os compromissos, sob a direção do nosso presidente Jair Messias Bolsonaro e do nosso presidente nacional Valdemar Costa Neto, cumpriremos e honraremos todos os nossos compromissos com a candidatura majoritária do Prefeito Ricardo Nunes e do nosso candidato a vice, Mello Araújo", disse a nota, que prevê punição a vereadores que apoiarem outra candidatura. "Lembrando que a coligação com o MDB e o prefeito é tão certa que a indicação do vice é do PL."

A eleição na capital paulista não é a única que Bolsonaro enfrenta dificuldade. No Rio de Janeiro, seu reduto eleitoral, Alexandre Ramagem (PL) apareceu com 9% na última pesquisa Quaest, que reforça o favoritismo do prefeito Eduardo Paes (PSD), que tem 60%. Em Minas Gerais, a mesma coisa: o bolsonarista Bruno Engler (PL) pontuou 12%, empatado tecnicamente com outros quatro candidatos.

 

Campanha do prefeito já esperava 'estica e puxa'

A instabilidade de Bolsonaro já era esperada pela campanha do prefeito Ricardo Nunes, que, embora se irrite com as frequentes mudanças de postura do ex-presidente, trata como natural esse "vaivém". "Vai ser assim a campanha inteira", declarou um interlocutor do prefeito, de forma reservada.

Assim como o entorno de Bolsonaro, membros da campanha do atual prefeito não acreditam em um rompimento abrupto. Para eles, a presença de Mello Araújo na chapa "mantém" Bolsonaro preso à candidatura do prefeito, assim como o apoio de Tarcísio. No passado, Bolsonaro já disse que não entraria em bola dividida com o governador.

 

 

POR ESTADAO CONTEUDO

Deixe seu Comentário