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Sem visão de para onde quer ir, país anda em círculos com sinais
contraditórios na economia e bloqueio mútuo do sistema político. Mas o
mal-estar também é global.
O ano de 2024 foi um ano perdido para o Brasil. E é de se
temer que 2025 seja semelhante. Isso depois da catástrofe dos anos Bolsonaro,
quando a sociedade brasileira se viu mais dividida do que nunca, a imagem
internacional do país ficou em ruínas, quase nenhuma família não sofreu o luto
de uma morte por coronavírus, minorias como indígenas temiam por suas vidas e o
meio ambiente foi deixado ao léu pelo próprio presidente para que fosse
destruído
Mas, em vez de um novo amanhecer, um novo começo, o país
está há dois anos sem rumo, preso na letargia. Uma razão para isso é que Lula
foi eleito principalmente por não ser Bolsonaro. Mas seu programa não tinha nada
a oferecer que os brasileiros já não tivessem ouvido antes: picanha e cerveja
barata para todos e um país que deveria ser "feliz" novamente. Isso
era muito pouco, mas foi o suficiente para vencer a eleição.
Lula, então, reconstruiu as estruturas estatais que haviam
sido gravemente danificadas por Bolsonaro, colocou a igualdade social de volta
no centro da política e deu novo destaque a questões como direitos humanos,
proteção ambiental e indígenas, nomeando ministros carismáticos.
No palco internacional, ele enfraqueceu muito a reputação do
Brasil na Europa ao se aproximar mais do Brics, hoje dominado por autocratas e
ditadores. Em troca, é provável que tenha marcado pontos com eles –
independentemente do que isso possa trazer ao Brasil.
Em áreas decisivas, no entanto, Lula parece ter sido
abandonado pela sorte e pela habilidade política, como mostrou o ano de 2024.
Embora alguns dados econômicos sejam muito positivos –
crescimento estável do PIB e queda no índice de desemprego – esses números
positivos não se refletem no humor da população. De acordo com uma pesquisa da
Genial/Quaest, 40% dos brasileiros acreditam que a economia se deteriorou nos
últimos 12 meses.
Além disso, 68% dos entrevistados afirmaram que seu poder de
compra caiu em comparação com o ano anterior. É claro que isso se deve à alta
inflação dos últimos anos (considerada o principal motivo da eleição de Donald
Trump nos EUA). Portanto, por enquanto, a picanha para todos prometida por Lula
não se concretizará.
Igualmente ruim para Lula: há dois anos, ele vem
pressionando em vão por uma redução da taxa de juros Selic, que está alta e
deve aumentar ainda mais em 2025. Isso não é bom para as famílias e para as
pequenas e médias empresas, mas é ótimo para os ricos, que podem seguir
aumentando sua riqueza sem esforço. A desigualdade no Brasil, que sempre foi um
dos principais males, fica assim mais cimentada.
Também é provável que o real se desvalorize ainda mais, com
uma taxa de câmbio prevista de R$ 5,96 por dólar americano em 2025 – apesar de
o real fraco ter sido um dos principais argumentos de campanha de Lula contra
Bolsonaro, ao lado dos altos preços da comida.
Outra promessa que Lula não está cumprindo: o déficit
primário zero em 2024. Em vez disso, o déficit do governo totalizou R$ 105,2
bilhões nos primeiros nove meses do ano, razão pela qual os investidores estão
cautelosos com o Brasil.
Bloqueio mútuo do sistema político
Mas é claro que não são apenas os dados econômicos
contraditórios e o mau humor da população que fazem de 2024 um ano perdido para
o Brasil, e que não apontam necessariamente para melhoras em 2025.
Há o bloqueio mútuo das instituições do sistema político
brasileiro, expresso de forma emblemática na disputa de poder sobre as emendas
parlamentares, que descaradamente são um veículo da corrupção tradicional e
epidêmica no Brasil. Nada muda neste país, o Brasil está condenado a continuar
andando em círculos. Todo novo começo termina de novo no começo.
Essa lei brasiliensis pode ser observada tanto na violência
nas favelas, que permanece inalterada há décadas, como nas flagrantes violações
da lei pela polícia militar mal treinada. Sempre há uma grande indignação
quando algo ruim acontece. E então nada acontece. Todo aviso, toda tentativa de
pensar em uma direção diferente, de tentar algo novo, é interrompida pela
atitude conservadora dos brasileiros.
As catástrofes no Brasil são anunciadas. Foi assim em
Brumadinho e aconteceu agora com a queda da Ponte Juscelino Kubitschek, que
liga o Maranhão e o Tocantins. Doze pessoas morreram, cinco seguem
desaparecidas e existe o risco de um desastre ambiental devido à queda de um
caminhão carregado de pesticidas no rio.
Os dois municípios conectados pela ponte – Estreito (MA) e
Aguiarnópolis (TO) – receberam R$ 35,6 milhões das emendas parlamentares. O
valor foi gasto em shows e luzes de LED, entre outras coisas, em vez de
reformar a ponte. O Brasil, ao que parece, está preso em um labirinto que construiu
para si mesmo.
Isso fica mais evidente na atitude da maioria dos
brasileiros sobre o meio ambiente. A quantidade de lixo que hoje pode ser
encontrado nas praias, nas paisagens e nos rios quando se viaja pelo país,
mesmo em lugares remotos, é de fazer chorar. E que, mesmo no governo Lula, a
destruição das florestas brasileiras seguir firme e 60% do país ter ficado em
alguns momentos coberto de fumaça de incêndios, é o sinal mais claro de que não
mudou muita coisa desde a saída de Bolsonaro.
Falta uma visão positiva também no mundo
Este governo e este país não têm uma visão e uma ideia de
para onde realmente querem ir. Por um lado, isso certamente tem a ver com a
idade de Lula, sua falta de frescor e da energia necessária. Por outro lado, no
entanto, é claro que se trata de um fenômeno global.
Não existe uma visão positiva. Tudo gira em torno do medo e
de batalhas defensivas: contra a catástrofe ambiental que as mudanças
climáticas e a extinção de espécies provocarão, contra a ameaça aguda da Rússia
contra a Europa (que o Brasil fica feliz em ignorar e minimizar), contra o
conflito sem fim no meio oriente, contra a guerra iminente no Pacífico, contra
as brigas que Trump desencadeará, contra as mudanças radicais que a IA já está
provocando, contra a violência cotidiana.
Em suma, é uma época bastante triste e temerosa, na qual os
demagogos estão florescendo. Uma das consequências é que muitas pessoas se
retiram para a esfera privada e tentam de alcançar a riqueza instantânea por
jogos de azar. Um sintoma: o sucesso das bets.
Se nada de extraordinário acontecer, 2025 será,
infelizmente, tão ruim para o Brasil quanto 2024.
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Philipp Lichterbeck queria abrir um novo capítulo em sua
vida quando se mudou de Berlim para o Rio, em 2012. Desde então, colabora com
reportagens sobre o Brasil e demais países da América Latina para jornais da
Alemanha, Suíça e Áustria. Ele viaja frequentemente entre Alemanha, Brasil e
outros países do continente americano. Siga-o no Twitter em @Lichterbeck_Rio.
Autor: Philipp Lichterbeck