O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu manter o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil-MA). A decisão foi tomada após reunião de Lula com o seu ministro na tarde desta segunda-feira (6).

Antes do encontro, líderes da União Brasil disseram a ministros palacianos de que exonerá-lo elevaria a rejeição do partido ao governo.

Embora tenha indicado três ministros, a legenda ainda não se assume como base de apoio a Lula no Congresso Nacional. Integrantes do partido, porém, fizeram chegar ao Palácio do Planalto o recado de que demitir Juscelino poderia significar levá-los para a oposição. A União Brasil tem 59 deputados e 10 senadores.

A manutenção do ministro no cargo ocorre após pressão de aliados por sua saída, em meio a denúncias de irregularidades envolvendo diárias recebidas pelo titular das Comunicações e o asfaltamento de uma estrada, com recursos de emenda, na sua fazenda no Maranhão.

Durante a reunião com Lula nesta segunda, o ministro defendeu-se das acusações e foi aconselhado a defender-se publicamente.

Após o encontro, Juscelino publicou uma mensagem nas redes sociais dizendo que a reunião foi "muito positiva". "Na ocasião, esclareci as acusações infundadas feitas contra mim e detalhei alguns dos vários projetos e ações do ministério. Temos muito trabalho pela frente."

Apesar de ter poupado o auxiliar, aliados de Lula esperam que a partir de agora o Planalto aumente a cobrança sobre a União Brasil para que entregue no Congresso Nacional o apoio e os votos para avançar as propostas de interesse do governo.

Segundo aliados do mandatário, caso a sigla não corresponda as expectativas, haverá retaliação ao partido como um todo.

Uma ala da União Brasil diz que a decisão de manter Juscelino representa um gesto de Lula e deve reduzir a resistência de uma parte do partido.

No entanto, não há a expectativa de que isso seja suficiente para colocar a legenda na base do governo.

Além de minimizarem as denúncias, aliados de Lula citam ao menos dois principais motivos para manter o ministro no cargo: não se indispor com a União Brasil; e abrir a porteira para saída de ministros e criar desgaste com pouco mais de dois meses de governo.

Alguns integrantes da União Brasil identificam nas denúncias fogo amigo contra o ministro, mas o partido está fechado em apoio a Juscelino.

Ademais, há um outro complicador, a saída do ministro abriria uma frente de disputa dentro do PT. O partido já queria, durante a transição, ter ficado com a pasta e pode, segundo aliados, tentar avançar sobre o ministério mais uma vez.

Fora isso, a demissão de Juscelino abriria um precedente muito cedo na Esplanada: ministros com complicações parecidas no futuro já teriam de deixar o cargo da mesma forma.

O entorno do chefe do Executivo diz que, apesar da decisão, Lula está muito irritado com o episódio.


Antes da reunião com o presidente, Juscelino publicou nesta segunda-feira um vídeo nas suas redes sociais no qual se defende das acusações de uso indevido de diárias e do avião da FAB (Força Aérea Brasileira).

O ministro aponta um "erro no sistema de diárias", que acabou incluindo indevidamente no cálculo dos valores as datas referentes a fins de semana, quando não teve agendas públicas. Juscelino ainda acrescenta que todas as diárias pagas indevidamente foram devolvidas aos cofres públicos.

No vídeo, o ministro afirma que vem sendo vítima de "ataques distorcidos", afirma que é "ficha limpa" e alega que não houve qualquer tipo de irregularidades em suas viagens.

Na semana passada, o presidente havia demonstrado insatisfação com a postura do auxiliar e afirmado que, caso não comprovasse sua inocência, ele não seria mantido no governo.

Em entrevista à BandNews, na quinta, Lula afirmou que teria uma conversa com Juscelino nesta segunda e que ele deixaria o governo se não conseguisse provar sua inocência.

No sábado, Juscelino Filho foi às redes sociais para dizer estar comprometido em mostrar a Lula que não houve irregularidade.

"Estou comprometido em esclarecer ao presidente Lula todas as denúncias infundadas feitas pela imprensa. Reitero que não houve irregularidades nas viagens citadas e que tudo está devidamente documentado. Também agradeço a oportunidade de ser ouvido com isenção e serenidade", disse.

A saída do ministro dividia aliados do chefe do Executivo. Enquanto a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), defendeu o afastamento temporário dele, outra ala do entorno de Lula vinha pregando que ele não poderia ser demitido —ao menos, não no curto prazo.

No fim de semana, a União Brasil saiu em defesa de Juscelino. Em nota, repudiou as declarações de Gleisi.

Um grupo de aliados do presidente vinha argumentando que demitir Juscelino neste momento poderia ser prejudicial para a construção da base na Câmara e ainda passar uma mensagem negativa com menos de três meses de governo.

Para alguns interlocutores de Lula, a saída de Juscelino Filho poderia gerar ruídos no Congresso com a União Brasil, que, além dele, influenciou a indicação de titulares de outros dois ministérios.

A Comissão de Ética Pública da Presidência da República vai, na próxima reunião do conselho, analisar o caso do ministro, conforme disse à reportagem.

"Informo que os conselheiros da Comissão de Ética Pública já tomaram conhecimento do caso, pela imprensa, e irão adotar as tratativas pertinentes sobre caso na próxima reunião do Colegiado", afirmou.

O próximo encontro dos conselheiros ocorrerá em 28 de março.

Juscelino recebeu diárias do governo federal por dias sem agenda de trabalho em São Paulo, São Luís e até no exterior. Até o momento, o total de diárias recebidas pelo ministro em duas viagens internacionais —a Portugal e Espanha— soma R$ 34,2 mil.

De acordo com uma nota divulgada pela pasta na quinta, o titular da pasta decidiu devolver o valor das diárias referentes às viagens do Maranhão e de São Paulo.

Na viagem a São Paulo, o ministro teve apenas duas agendas oficiais e aproveitou a estadia na capital paulista para participar de um evento relacionado a cavalos Quarto de Milha, como revelou o jornal O Estado de S. Paulo. Juscelino Filho é criador de animais da raça.

Ele foi para São Paulo e voltou para Brasília em aviões da FAB. Isso aconteceu, segundo o Ministério das Comunicações, porque "o ministro foi cumprir agenda oficial, de interesse público".

Além disso, também segundo o jornal O Estado de S. Paulo, Juscelino Filho direcionou verba do Orçamento para asfaltar uma estrada que corta sua fazenda, em Vitorino Freire (MA), antes de assumir o Ministério das Comunicações, quando era deputado na ativa.



FOLHA de S.PAULO

 foto: Reprodução

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